terça-feira, 20 de novembro de 2007

Onze de Fevereiro de Dois Mil e Sete: O verdadeiro período de reflexão começa agora.

«Emetismos vaginais
(Ainda tentei, mas não resisti...)



- Senhor Doutor, dá licença que o corpo seja meu? (link para o DN, convém ler antes).

- Mas eu proibo-a dalguma coisa? Por quem é, disponha dele à vontade. Venda-o, alugue-o, hipoteque-o, faça como lhe der na real gana!...

- Então, interrompa-me!...

- Desculpe...?!

- Percebe o que eu quero dizer: extraia-me este feto inconveniente.

- Como? Extraio-lho? Então o corpo não é absolutamente seu? Não o produziu sozinha? Então extraia-o a menina. O seu corpo não tem - além de útero, clitóris e ovários - mãozinhas?! O corpo é seu, o feto é seu, pegue nas suas mãozinhas e extraia-o livremente. Se o fez sozinha, desfaça-o agora.

- O senhor doutor está a brincar com coisas sérias. A lei obriga-o a fazer-me esta lipoaspiração interna!... Este calo incomoda-me bastante. Prejudica-me a carreira. Atenta contra a minha liberdade!...

- De maneira nenhuma brinco. Estou seríssimo e compenetrado. O corpo é seu, o feto é seu, porque é que o problema há-de ser meu. Ou seja, a menina quer o corpo, arranja o feto e depois inventa descarregar o problema nos outros?!...

- É um problema social!...

- Mais parece um problema mental. E grave. Vai-me dizer a seguir que foi a sociedade que a emprenhou? Tenha paciência. Se o corpo é império exclusivo seu, ninguém tem o direito a meter o bedelho nisso. E se não o bedelho muito menos as mãos. Seria invasão da propriedade alheia. Portanto, o que a menina faz com ele é soberania e responsabilidade absolutamente sua. O outro doido dizia “O Estado sou eu”; a menina, no intervalo das bebedeiras, proclama “O Corpo sou eu!”- do Rei-Sol passamos, assim, ao Umbigo-Sol. Ou ao Clitóris-Sol, como queira. Pois que lhe faça muito bom proveito.

- Mas como quer o senhor que eu resolva isto sem ajuda médica? Promove que me dirija a um vão de escada ou a uma clínica privada? É isso? Uma clínica onde, se calhar, até dá consulta...

- Não, de todo. A minha posição é simples: visto que a menina se auto-emprenhou, então auto-despeje-se. Apenas cumpro a sua bela lógica. Ou a menina, na lógica é como em tudo na vida: gosta muito do aleive mas não quer saber das consequências?

- Se o senhor não cumpre a lei, eu... eu chamo a polícia!

- Olha que bela moral: para que a menina seja a dona absoluta do seu corpo e das birras e caprichos que nele cozinha, sou eu forçado a abdicar do meu, na ponta dos esbirros se necessário for! A liberdade plena das suas vísceras faz-se à conta da sujeição prepotente das minhas mãos e ideias. A sua liberdade floresce da abolição da minha.

- Não tergiverse nem falacione, senhor doutor! Um governo eleito, após referendo nacional, tem todo o direito de implementar as leis que a maioria da minoria votante escolheu e legitimou. O senhor está obrigado a cumprir a lei.

- A lei obriga-me? Mas alguma lei a obrigou a ficar nesse estado? Algum meliante a forçou a emprenhar involuntariamente? Então não foi no exercício da propriedade e liberdade ufana do seu corpo que lhe fez isso, ao seu principado? E agora em nome do mesmo princípio quer fazer exactamente o contrário disso? Temos aqui a Anti-Penélope: faz de noite e desmancha de dia. Lembra-me a fábula do macaco do rabo cortado: a menina quer mudar de estado à mesma velocidade com que muda de capricho!... A donzela, que não quer saber dos interesses da sociedade para nada, acha que, em contrapartida, é esta que se deve submeter ao despotismo esclarecido dos seus caprichos, isto é, das suas efervescências do momento?! Mas acha que um país é uma loja de conveniências?... Que um médico é um esteticista dos calos?

- Mas como quer o senhor doutor que eu exerça um direito que a lei me confere, se não for devidamente assistida?...

- Entenda-se com a lei: vá ter com os deputados, com os ministros, com os polícias, com os advogados e os juizes: eles que lho deram, o direito, eles que lho resolvam! Eu, de momento, não estou para aí virado. E se são os efeitos da torcida que a perturbam, resolva por baixo como é costume resolver por cima: deite os dedos ao orifício e tente irritar a goela. Afinal, no seu caso, a cloaca não há-de diferir muito da matraca.»


Em Dragoscópio

2 comentários:

Tiago Mendonça disse...

Fantástico! A brincar, a brincar ai está uma grande verdade...

Luís Guerreiro disse...

Este Dragão é demais...